Um destes dias assim do nada surgiram-me uma série de ideias que me suscitaram a seguinte questão:
O que importa é o que fazemos ou o que queremos fazer?
Vejamos as coisas desta perspectiva:
Estamos na mesa de jantar quando alguém desajeitadamente dá um toque na garrafa de vinho ( cheia e de vinho tinto, para dar mais impacto) e esta começa a cair na sua direcção, se reflexo se outra coisa consegue desviá-la acabando por encher de liquido o ocupante ao lado, naquela fração de segundo em que está tudo calado e em "mini-choque" podem acontecer várias coisas que ditam o desfecho da cena:
ⓛ "Ainda tentei apanhar mas não consegui"
O que vem seguido de "Não faz mal não tiveste culpa"
ⓛ "Não me quis sujar"
"Então sujas-me a mim?Agora que remédio tens senão limpar"
ⓛ "Porque é que não tiveste cuidado em vez de dares um toque na garrafa? Se não a tivesses atirado eu não a tinha desviado para ele"
Observo então que o culpado desta situação (e possivelmente o que vai lavar a roupa) é determinado não pelo acto em si, mas pela conversa e reacções que ocorreram após o acidente. Então, se para uma coisa desta insignificância pensamos assim, como será com decisões em que o peso da culpa será maior?
Joana sempre cuidou de seu pai e custava-lhe ver o seu sofrimento tão grande a aumentar dia após dia sem mais conseguir comunicar com ele (era apenas um corpo ligado a uma máquina) enquanto que Andreia apenas esperava o dia em que herdaria parte da fortuna de seu pai.
Um dia, farta de esperar Andreia trocou o soro da máquina por um tranquilizante que o pusesse a dormir "de vez" durante a noite.
Não fazendo ideia disto, Joana decidiu finalmente aceder ao último pedido lúcido do velho José e pôr fim ao seu sofrimento, em lágrimas tirou-lhe o saco com o soro e trocou por um vazio.
(Não faço ideia se o soro é assim tão importante mas dá para perceber aonde quero chegar).
Na manhã seguinte ambas dão com o progenitor morto e apesar de não terem coragem para falar disso o sentimento de culpa obriga ambas a confessar o "assassínio".
Chega a autópsia revelando efectivamente que apesar de encontrados vestígios estranhos de tranquilizante ele morreu por falta de soro.
Chegamos então aqui ao ponto da questão, quem é que irá presa pela morte do pai?
ⓛ A gananciosa e mal intencionada Andreia que a ficar por aí à solta pode perante outra oportunidade matar mais alguem por dinheiro?
Não, pois ela não teve qualquer influência na morte do pai;
ⓛ O que nos deixa com a meiga e bem-intencionada Joana, que apesar de ter efectivamente morto o pai acabou por o "salvar" de uma tentativa diferente de homicídio que o acabaria por matar se ela não tivesse feito nada, Joana acabará claro, por ser declarada culpada.
"Mas isto só mostra que somos julgados pelo que fazemos e não pelo que queremos fazer"
O leitor certamente encontrou-se a torcer para que a pena de Joana, apesar de justa (matou o pai) não seja muito severa (quis acabar com o sofrimento).
Imagine agora que eu tinha trocado os nomes.
A acção seria exactamente a mesma mas não estaria agora a pensar : "que fique na cadeia uns bons anos a gananciosa"?
Quem é que lava o vinho tinto então?
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